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Cena da Semana

publicado em:15/05/11 9:37 PM por: Kamila Azevedo Cena da Semana

(Lobão no Rock in Rio II [1991] – O Estranho Mundo de Zé do Caixão [2009])

“O Sepultura termina sua poderosa apresentação ovacionado por todos e, em poucos minutos, os urros de aclamação se transformaram em gritos de “fora Lobão! Não queremos samba! Fora, seu sambista de merda, tá querendo manchar o rock…”, e outras coisas mais… Por um momento, tive tempo para refletir sobre a ironia: sempre fui rechaçado pela cultura oficial, sob o epíteto de roqueiro… Agora, assistia àquele vitupério de roqueiros fundamentalistas a me odiarem por “mestiçar” o rock imaculados… loucura…

Mais alguns instantes, projéteis das mais variadas naturezas eram atirados ao palco. Como a profundidade não passava dos dois metros, havia risco real de alguém se machucar seriamente… Estavam enchendo as latas de cerveja de areia, tornando os arremessos muito contundentes caso pegassem em alguém ou em algum instrumento. Também jogavam pilhas grandes, caixas de biscoito, papel higiênico molhado, moedas…

Eu tentei, pela última vez, fazer ver aos diretores do evento que era absolutamente impossível realizar o show naquelas condições, mas eles foram inflexíveis…

Sabendo que não iria conseguir chegar nem na segunda música, estava me sentindo um daqueles cristãos jogados aos leões no Coliseu.

Quando estava prestes a entrar, alguma boa alma me passou um capacete da Cruz Vermelha e disse: “Acho que você vai precisar disso.”

Olhei para os meninos, respirei fundo e entrei naquela arena. Não paravam de jogar coisas pesadas, contundentes… em qualquer outra circunstância, interditariam o evento… Nós estávamos nitidamente numa arapuca. Ensaiamos num palco absolutamente seguro e, 24 horas depois, somos atirados em um paredão de fuzilamento. Não dava tempo nem para ter raiva. Começamos a primeira música num clima de linchamento, sem que eu tivesse a mínima coragem de me defender do que jogavam. Aguentei aquilo para que fosse registrado… primeiro: para terem a certeza de que não estava drogado. Segundo: para numa posteridade distante, poder provar a barbaridade à qual fui submetido, sem um órgão de imprensa sequer denunciar aquilo.

Quando uma lata de cerveja, cheia de areia, derruba um surdo do Kadu, que estava a quatro metros mais alto do que  o resto da banda, verifiquei ser impossível continuar com aquela palhaçada. E a ironia é que, tirando o gargarejo metaleiro, o estádio estava repleto de faixas com o nome das minhas músicas.

Setorizei o esporro meticulosamente, incluindo apenas os agressores, me despedi do público restante e saí. Esta cena está à disposição no YouTube, e quem tiver a curiosidade de assistir constatará o paredão preto atrás de mim”.

(Texto extraído do livro “50 Anos a Mil”, de Lobão com a colaboração de Claudio Tognolli)



Jornalista e Publicitária


Comentários


Que maldade e falta de educação por parte das pessoas que estavam no show. Não a toa essa reação dele, até dou razão.

Beijos e tenha uma ótima semana! 😉

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Nossa, nem lembrava disso. E Lobão era roqueiro, imagine… Vaias e latas jogadas que ficou marcada em minha memória foi no Rock in Rio III com Carlinhos Brown. Falta de educação é sempre lamentável.

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Mayara, pois é! Beijos e ótima semana!

Victor, rsrsrsrs

Amanda, a cena do Carlinhos Brown também tá fresquíssima na minha mente. E a situação dele foi parecidíssima com a do Lobão!

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De fato que Lobão é um artista subversivo. Não curto o trabalho dele mais reconheço que ele é bastante original.

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HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA!
“Vão vocês todos tomar no cu, exceto aqueles que não tomam no cu”.

Sábias palavras.

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