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Lendo – “A Privataria Tucana”

publicado em:26/06/12 1:12 AM por: Kamila Azevedo Livros

“Fiquei pasmado com a voracidade de alguns grupos e a disposição de levar vantagem a qualquer custo. E, após anos de trabalho, percebi que o volume do material que havia levantado, a necessidade de explicar os artifícios empregados nas fraudes, a profusão de personagens e seus laços com terceiros implicados, o desdobramento dos fatos ao longo de vários anos e a contextualização exigida para melhor compreensão dos acontecimentos impunham outro formato. Matérias de jornal não bastariam para descrever o que tinha em mãos. Seria preciso mais para melhor contar o caráter de uma época e dos seus protagonistas. Será gratificante se, depois da última página o leitor mantiver seus olhos bem abertos. É uma boa maneira de impedir que aqueles que já transformaram o público em privado para seu próprio proveito tentem reprisar algum dia o que foi feito na era da privataria”. (p. 31)

No decorrer da leitura de “A Privataria Tucana”, livro escrito pelo jornalista Amaury Ribeiro Jr., os sentimentos serão conflitantes. Explico: como tudo que envolve um tema delicado como é a política, a interpretação do texto vai depender diretamente da ideologia na qual você acredita. Se você for alguém que se identifica com o PSDB, vai pensar que este livro é uma bravata escrita por alguém que, com certeza, é ligado ao PT. Se você não se identifica com o PSDB, você vai ficar indignado com cada linha de cada parágrafo escrito pelo autor, que, para escrever essa obra, se dedicou a um minucioso trabalho de investigação, contando, inclusive, com documentos que corroboram a tese a qual ele defende durante a sua explanação – o que dá credibilidade ao seu relato.

E que tese seria essa? Se o mensalão é considerado por alguns como o maior escândalo de corrupção da história do Brasil, aquilo que Amaury Ribeiro Jr. chama de “privataria tucana” seria o maior assalto ao patrimônio público brasileiro. Tentando resumir 344 páginas de um livro repleto de informações a cada nova página, a obra faz uma investigação sobre as privatizações ocorridas no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e sobre como isso foi o princípio de um esquema de desvio e de lavagem de dinheiro operado por pessoas que se revelaram diretamente ligadas ao ex-ministro da Saúde e do Planejamento de FHC, José Serra, que, curiosamente, era o adversário de Dilma Rousseff na campanha presidencial de 2010.

Mas, você deve estar se perguntando, o que Dilma tem a ver com essa história? Foi no decorrer da campanha presidencial entre ela e Serra que o teor do livro escrito por Amaury Ribeiro Jr. estourou na grande imprensa, na medida em que o jornalista se viu envolvido indiretamente em um escândalo que tinha como nomes principais aqueles que faziam a gerência de comunicação da campanha da candidata, que haviam sido acusados de fazer parte de um grupo de inteligência que trabalhava a favor de Dilma. Aliás, neste sentido, encontramos uma das partes negativas de “A Privataria Tucana”, uma vez que boa parte do livro é dedicada a uma espécie de defesa que o autor faz de si mesmo – o que o transforma em um personagem tão importante para a obra quanto figuras como Fernando Henrique Cardoso, Sérgio Motta, José Serra, Ricardo Sérgio de Oliveira, Gregório Marín Preciado, Verônica Serra, Rui Falcão, Alexandre Bourgeois, Luiz Lanzetta, entre outros nomes que aparecem no livro.

Para fazer um pequeno paralelo, é como se, caso “A Privataria Tucana” fosse um documentário, Amaury Ribeiro Jr. seria uma espécie de Michael Moore. Ribeiro é um jornalista premiado, com grande histórico como repórter investigativo, em casos dos mais diversos possíveis, não somente na política. Seu livro é um grande trabalho colaborativo com matérias de outros jornalistas (todos devidamente creditados na obra), bem como com as suas próprias fontes. A palavra dele ali é a mais forte e todos sabemos que a palavra escrita tem um poder de convencimento incrível. É, sem dúvida, um trabalho de investigação que chama a atenção e que só pecou por um pequeno problema: não dar espaço ao outro lado da história se defender.

Voltando um pouco àquilo que falamos no início de nossa resenha crítica sobre “A Privataria Tucana”, os sentimentos são muito contraditórios mesmo durante a leitura do livro. Entretanto, Amaury Ribeiro Jr. joga uma luz na mente do seu leitor e que nos revela qual o grande objetivo por trás de sua obra: é nos mostrar que, no nosso mundo atual, não dá mais para se varrer a sujeira para debaixo do tapete, pois “não há tapete suficiente para acobertar tanto lixo”. Ele ressalta a necessidade de investigações oficiais e de punições severas para aqueles que sejam devidamente culpados em crimes desse tipo, de colarinho branco, que tomam de assalto (com trocadilho proposital) a máquina pública. “Se jogar uma luz sobre este passado ainda imerso nas sombras, este livro, que termina aqui, terá cumprido a sua parte. E tudo o que houve terá valido a pena”. Eu, com a permissão do autor, ainda acrescentaria: tudo que houve, tudo que ocorre e tudo que ainda há de acontecer.

A Privataria Tucana (2011)
Autor: Amaury Ribeiro Jr.
Editora: Geração Editorial

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A última modificação foi feita em:outubro 21st, 2019 as 6:10 pm


Jornalista e Publicitária


Comentários


Tenho nojo de politicos mas procuro me informar sobre a politica.Esse livro é uma prioridade minha.Legal esse paralelo com Michael Moore,gosto mt dos documentários dele,principalmente “Tiros em Columbine”(apesar de se expor demais e querer aparecer mais que o entrevistado).Esse último filme que vc viu gerou um debate caloroso(e mt bom por sinal) no blog Hollywoodiano do Otávio.Espero finalmente ler sua critica e já antecipo:não gosto do filme pq o diretor se acovarda com um tema tão polemico.Melhor esperar a critica…rsrsrs.

Beijos!

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Paulo, por mais que a pessoa tenha nojo desse assunto, é importante que a gente se informe, até mesmo para a gente encontrar o nosso melhor posicionamento sobre este assunto. Eu gosto do Michael Moore, mas acho que ele anda por um terreno muito perigoso, onde a sua verdade é a absoluta e eu sempre desconfio muito disso. Eu adorei “Histórias Cruzadas” e acho que o filme não é covarde diante de um tema tão polêmico. Pelo contrário. Beijos!

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Eu quero muito ler esse livro, está na minha lista de títulos para ser conferidos em breve.

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Um colega meu já tinha me indicado… Quero ler, principalmente por não entender muito do assunto em questão (ou seja: política no geral mesmo!). Será um dos próximos a ser lido, com certeza!

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Luís, leia. É um livro muito interessante.

Raspante, leia, sim. Espero que goste! É um livro muito informativo.

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Kamila, sou pessimista em relação a mudança de comportamento de nosso governantes e não acredito em politico ou partido algum.

Infelizmente todos os partidos políticos estão envolvidos em corrupção, junto com poderosos (grandes empresários, corporações, bancos) e este mar de lama vai continuar por gerações.

A privatização tucana foi um assalto ao cofres públicos, assim como o mensalão e outros escândalos do governo PT deram o mesmo prejuízo. Assim como este livro sobre o PSDB, leia também “O Chefe”, que fala sobre Lula e os escândalos do PT.

Até mais

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Hugo, eu também sou muito pessimista em relação à mudança de comportamento por parte dos políticos e sou que nem você: não acredito em nada… Anotei a sua dica de livro. Irei procurar pra comprar. Até mais!

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Eu li os dois livros, “O chefe” é um apanhado de matérias públicadas pela globo, estadão e principalmente a Veja, o próprio autor afirmou que não se tratava de um livro investigativo e foi um fracasso retumbante, nem a imprensa o levou a sério, ja o livro do Amauri Jr é baseado em 10 anos de investigação e recheado de informações até então desconhecidas e embasadas com documentos com fé pública, não da compara-los, ja os escandalos, o mensalão pode ser comparado a um batedor de carteiras e a privataria tucana uma asaltante de bancos, é só analizar os valores envolvidos em ambos os casos.

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Angela, não conheço ainda “O Chefe”, mas tentarei ler a obra. Realmente, um dos pontos mais fortes de “A Privataria Tucana” é o trabalho investigativo feito pelo autor do livro.

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Kamila, certamente devemos , em detrimento à realidade brasileira, ainda ter esperança de que as coisas irão mudar. Escândalos envolvendo a politicagem vão continuar existindo, mas creio firmemente que os que possuem alguma dignidade ainda vão fazer a diferença.

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Flavio, a esperança deve até existir, mas vamos admitir que isso é muito difícil de ocorrer porque, primeiro, tem que existir a mudança de mentalidade e isso é muito complicado. De qualquer maneira, espero e torço para que apareça alguém que, realmente, faça a diferença.

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