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A Rede Social

publicado em:20/12/10 9:22 PM por: Kamila Azevedo Cinema

Baseado no livro “Bilionários por Acaso”, de Ben Mezrich, o filme “A Rede Social”, do diretor David Fincher, compartilha uma grande característica com a obra literária na qual se inspira: ambos são estruturados com base nos depoimentos de terceiros sobre uma única pessoa. O longa está tão ciente disso que uma de suas personagens, a advogada Marylin Delpy (Rashida Jones, do seriado “Parks and Recreation”) nos deixa a seguinte mensagem, ao final de “A Rede Social”: “85% de um depoimento é baseado no emocional, enquanto os 15% restantes são perjúrio”. Esta é somente uma constatação ao fato de que, ao final da sessão, não saberemos ao certo se Mark Zuckerberg é um vilão, alguém que foi um pouco mal aconselhado,  uma pessoa que só entrou no jogo e fez o que tinha que fazer para sobreviver ou um cara que, nas palavras da própria Marylin “não é um babaca, mas se esforça muito em parecer um”.

O roteiro escrito por Aaron Sorkin (responsável por algumas das melhores séries vistas na TV norte-americana na última década, como “Sports Night” e “The West Wing”) conta a história de sucesso por trás da criação do Facebook, rede social fundada em 04 de fevereiro de 2004, que começou como uma forma de reunir estudantes universitários norte-americanos e se expandiu de tal forma que, hoje, está presente em quase todos os continentes atraindo mais de 500 milhões de usuários. Um fato que chama a atenção na trajetória do Facebook é que, ao contrário do que se pode ver em outras empresas da Web, que são criadas, atingem sucesso e, rapidamente, são vendidas a algum conglomerado maior, o Facebook se mantém ligado à figura de seu criador, que é ainda o CEO da empresa e o mais jovem dono de uma fortuna bilionária no mundo.

O filme nos leva de volta àquelas noites de 2003, quando Mark Zuckerberg (o talentoso Jesse Eisenberg) e seu melhor amigo Eduardo Saverin (Andrew Garfield) uniram forças para trabalhar na ideia que levaria à criação do Facebook. Provavelmente, nenhum deles sabia que daquele local surgiria uma das maiores ferramentas de renovação nas formas de comunicação. A verdade é que estes dois jovens tinham muita inexperiência, informalidade, uma certa dose de arrogância e aprenderam muito durante a trajetória de criação e de consolidação do Facebook.

A novidade que se acrescenta a esta história é um caso típico de picuinha do mundo corporativo e que também nos diz muito sobre a personalidade de Mark Zuckerberg. Acusado de roubo de propriedade intelectual, entre outras coisas, pelos irmãos Cameron e Tyler Winklevoss (Armie Hammer) e pelo sócio deles Divya Narenda (Max Minghella); e colocado na justiça pelo, agora, ex-melhor amigo Saverin, que acabou sendo “passado para trás” nas muitas expansões de capital do Facebook. Zuckerberg se vê como uma vítima de seu próprio joguete e os depoimentos mostram que, por trás de uma mente genial, existe uma pessoa ressentida e capaz de tudo para conseguir aquilo que quer.

Neste sentido, é importante mencionar a forma como o caráter de Zuckerberg é construído ao longo de “A Rede Social”. Desde a primeira cena, ele mostra ser um cara obsessivo, em primeiro lugar, em entrar para uma daquelas fraternidades típicas de universidades norte-americanas (clubes exclusivos, formado basicamente por gente de muita influência e prestígio). São as decepções em busca deste caminho que o levam a todas as suas criações: o Facemash (que estimulava a disputa entre a beleza das alunas do dormitório do campus de Harvard, onde ele estudava) e, finalmente, o Facebook. Mark era alguém em busca da fama e do topo da cadeia social. O que o filme reforça é a ideia de que isso é possível, mas não sem deixar inúmeros inimigos para trás e correr o risco de viver uma vida que, na verdade, é extremamente solitária (e isso Mark, na verdade, o é – uma vez que as pessoas que o procuram [e, neste caso, podemos muito bem citar o Sean Parker, fundador do Napster, vivido por Justin Timberlake] estão atrás somente daquilo que uma pessoa como Zuckerberg pode trazer de benefícios para eles).

Por ser um grande estudo sobre um personagem, “A Rede Social” tem sido bastante comparado com “Cidadão Kane”, clássico do cinema dirigido por Orson Welles. Baseado na vida de William Randolph Hearst, um magnata da comunicação, “Kane” falava sobre a investigação do caráter de um homem que, por meio da aquisição de bens e pessoas, buscava somente preencher grandes lacunas de seu passado. Analisando por este prisma, existem, sim, paralelos entre a obra de Welles e o filme dirigido por David Fincher – uma vez que Zuckerberg, na sua busca por chamar a atenção dos clubes (que, na mente dele, eram exclusivos, divertidos e levavam a uma vida melhor), acabou criando o seu próprio espaço, onde ele era o manda-chuva e ditava as regras do jogo.

Porém, vendo do ponto de vista da linguagem cinematográfica, um abismo separa “Cidadão Kane” de “A Rede Social”. Em sua obra, Fincher não foi tão além quanto Orson Welles, que, naquela época, fez uma enorme revolução na forma de se fazer cinema. Entretanto, Fincher confirma seu nome como um dos grandes diretores de seu tempo, ao criar um filme de caráter documental com grande visão estética e que faz o relato de uma história que tem muita ressonância com os dias de hoje, especialmente com a sociedade norte-americana, a qual é movida pela competição e pela busca pelo sucesso. Para os norte-americanos, admitir um fracasso é a maior derrota que eles podem ter. Por isso, a grande relutância na admissão de que, talvez, Zuckerberg tenha mesmo roubado a ideia dos irmãos Winklevoss e Narenda e tenha mesmo passado seu melhor amigo para trás. O curioso é que, em nenhum momento, Mark admite isso – e nem mente sobre isso. E isso, talvez, diz mais sobre o caráter dele do que tudo aquilo que vemos em “A Rede Social”.

Cotação: 9,5

A Rede Social (The Social Network, 2010)
Direção: David Fincher
Roteiro: Aaron Sorkin (com base no livro de Ben Mezrich)
Elenco: Jesse Eisenberg, Rooney Mara, Joseph Mazzello, Andrew Garfield, Rashida Jones, Armie Hammer, Max Minghella, Justin Timberlake



Jornalista e Publicitária


Comentários


É um filme ‘encantador’ – rapido, muito pratico, que conta uma história um tanto delicada e muito interessante, de uma personalidade também interessante, e felizmente não é só isso, tem toda uma mensagem por traz desse filme muito bem dirigido por Fincher, com o apoio de um texto muito fiel de Sorkin, ótimo filme.

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David Fincher consegue mesmo fazer um filme ágil e realista. Gosto bastante do resultado. E interessante sua colocação quanto a não admitir o fracasso.

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Bom filme este, concordo com a direção cuidadosa de Fincher e do elenco afiado. Mas, não consigo ver uma obra tão especial e excepcional como todos acham. Não vejo obra-prima no “A Rede Social”. Às vezes, o tom ágil e verborrágico do roteiro irrita e deixa ele levemente cansativo. Mas, não compromete a obra. Decerto, o filme tem mais méritos!

Acho que Garfield atua muito bem, assim como Timberlake, mas é óbvio que Jesse Eisenberg é o ponto forte do filme. Acho que esse garoto vai longe!

Seu texto está ótimo, Ka!
Gostei, pois trabalhou mais nele.
Beijo!

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Cleber, concordo com os aspectos da direção e do roteiro que você ressalta em seu comentário.

Amanda, obrigada!

Cristiano, não achei a obra cansativa. Ela prendeu a minha atenção do início ao fim. O Eisenberg, aqui, só confirma o grande talento que ele tem. Obrigada! Beijo!

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Grande Ka. Belo texto. Vc levantou muito bem os aspectos trabalhados no filme. E quanto a essa comparação entre Kane e A rede social. Não me precipitaria quanto aos dividendos. Esse filme de Fincher ainda agregará muito valor e reconhecimento (assim como ocorreu com Kane) no futuro…
Beijos

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Não consigo pensar, nem por um segundo, que A Rede Social tenha de fato qualquer semelhança com Cidadão Kane. Vejo isso mais como especulação, como fantasia de marketing para o filme (os primeiros a falarem nisso foram os críticos norte-americanos que veneram o filme e os próprios produtores). Não gosto do filme pela maneira errática e artificial como as coisas se dão.

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Tb penso como o Pedro Henrique… não tem como comparar os dois filmes.

No mais, estou na mesma sintonia que vc. Eis um dos melhores filmes do ano.

Abs.

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Reinaldo, obrigada! Se vier o reconhecimento e o valor, futuramente, isso será totalmente merecido. Beijos!

Pedro, nem eu consigo pensar isso. Mencionei o fato porque as comparações têm sido constantes.

Bruno, eu também acho que não tem como comparar os dois filmes. Abraços!

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Os paralelos com Cidadão Kane são mais pela estrutura em flashbacks que formam um mosaico e traçam um perfil do personagem bem-sucedido porém solitário e com o achado final de A Rede Social que é quase o seu Rosebud. Mas as semelhanças param por ai, e sinceramente acho que Kane possui tantas camadas que não dá pra levar a sério essas comparações, o que em nada diminui A Rede Social, que se impõe naturalmente como um dos melhores filmes de 2010.

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Texto perfeito. Acho que o filme é sobre o desejo de aceitação que o personagem quer, mas a ambição foi demais. rsrs. Mas, concordo com tudo o que você destaca. Quero muito ler o livro. Mesma nota. rsrs.

Beijos! 😉

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Mandy, feliz Natal!! Beijos!

Mayara, obrigada! O livro será a minha próxima leitura. Beijos!

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Concordo com o Vlademir. As comparações com “Cidadão Kane” devem se limitar, no máximo, ao roteiro e à estrutura dos flashbacks. Estilisticamente, não. A Rede Social é classicista, está mais para Howard Hawks. O que não o faz menor que o filme do Welles, só por não ser maineirista.

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Mark Zuckerberg foi construído no filme como um nerd obsessivo, chato, frio, mas um gênio. Com certeza, a tecnicidade é o que faz o filme ser único no gênero e o que confere o estilo de documentário. Roteiro, direção e montagem impecáveis…

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Achei o filme ótimo, o grande ponto é o roteiro ágil que nos prende até o final, o Jesse transmite toda a carência e necessidade de atenção que o Mark tanto procura e faz ele ser como é. Ótimo texto Kamila.
Abs.

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Excelente filme mesmo.

Você assiste e dá vontade de cancelar (caso você tenha) a sua conta no Facebook (ou de qualquer outra “rede social”), principalmente depois daquela cena final.

Além da interpretação do eisenberg, o timberlake está ótimo no papel do criador do napster (de fato o cara é apenas uma ladrão de música mas se acha um deus…).

Serve para baixar um pouco a bola desta “Geração Y”.

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Jonathan, também adorei o filme. Obrigada! Abraços!

Henrique, excelente, mas não acho que ele dá vontade de cancelar a conta do Facebook ou de qualquer outra rede social. Pelo contrário. O filme chamará ainda mais atenção ao site.

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O filme p/ mim n foi nem bom, nem ruim. Contou a história do Mark, mas não vi nada especial. N é meu estilo de filme, eu prefiro mais Os piratas do vale do silício! No fim das contas o filme mostrou bem o quanto o criador o facebook é idiota, mas msm assim entendo que deve ter sido uma ótima publicidade! O cara não fez nada demais em termos de programação, ele pegou uma ideia genial e transformou no facebook, acho que o sucesso dele foi muito mais devido as pessoas a sua volta que a si mesmo.

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Mandy, não acho que o Mark era um idiota. E o filme mostra justamente isso. Ele se esforça em ser um idiota. E não menospreze o espírito empreendedor e o talento dele. Se fosse tão fácil fazer o que ele fez, todo mundo tinha uma ideia de sucesso por aí!

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Eu não menosprezo a ideia (que por sinal nem foi dele) e sim o trabalho, que em termo técnicos não foi nada demais. Na área de TI existe muitos outros gênios que merecem muito mais atenção. Acho que o grande foco é idade x dinheiro. Ele não é gênio, nem empreendedor. Acho que ele deu muito mais sorte.

O que eu achei foi que após o filme, mesmo não sendo a intensão deles, achei ele mais idiota. Por que se esforçar em ser idiota, nada mais é que ser idiota ao cubo. hehehehehe

Bjãooo

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Mandy, como assim, a ideia não foi dele? O Facebook é um projeto independente. O Zuckerberg expandiu a ideia dos Winklevoss, mas o que ele fez nada tinha a ver com o Harvard Connection. Discordo totalmente de você…. Ele é empreendedor, sim. Não tem fator sorte, aqui, não. É competência também!

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