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A Dama de Ferro

publicado em:7/03/12 1:18 AM por: Kamila Azevedo Cinema

O cinema britânico, quando fala dos seus líderes políticos, tem uma característica bastante peculiar. É difícil você encontrar uma obra que mitifica essas personalidades. Pelo contrário, muitas vezes o retrato, especialmente se estamos diante de filmes sobre a vida da Monarquia britânica, chega a ser novelesco, caricatural e irônico, enfocando os jogos de sedução e de influência na corte. Curiosamente, esse é o tipo de visão que foi evitada nos dois últimos longas sobre as duas últimas mulheres mais poderosas do Reino Unido: a rainha Elizabeth II (que foi mostrada no filme “A Rainha”, de Stephen Frears) e a Primeira-Ministra Margaret Thatcher (cuja vida foi retratada em “A Dama de Ferro”, filme dirigido por Phyllida Lloyd).

Por isso mesmo, é impossível assistir “A Dama de Ferro” e não tecer comparações com “A Rainha”. O filme de Stephen Frears acompanha aquela que foi a maior crise enfrentada por Elizabeth II em seus sessenta anos de reinado (a que se seguiu após a morte da Princesa Diana, em um acidente de carro em Paris). Frears, em seu filme, enfocou bastante o aspecto da solidão do poder, ainda mais quando exercido por alguém como Elizabeth, que ascendeu ao poder muito cedo, aos 26 anos, depois de ver o pai (o rei George VI, cuja história de ascensão ao reino foi contada no último vencedor do Oscar de Melhor Filme, “O Discurso do Rei”) sucumbir após sérios problemas de saúde causados diretamente pelas responsabilidades do reinado.

Já a visão de Phyllida Lloyd e da roteirista Abi Morgan sobre Margaret Thatcher (Meryl Streep) é bem dfiferente. Desde cedo, mostra uma jovem Margaret (Alexandra Roach) fascinada pela política – que era exercida pelo seu pai (Iain Glen), um quitandeiro – e que sempre esteve alinhada aos interesses do Partido Conservador. Está claro que Thatcher era uma figura dominante nas várias esferas de sua vida, tinha muita ambição e que fazia questão de lembrar, especialmente aos seus subordinados, nem sempre de maneira dócil, que a decisão final era a dela. Ou seja, ela gostava bastante de exercer o poder.

“A Dama de Ferro” adota um recurso narrativo que é um tanto clichê: na velhice, já sofrendo de demência, tendo alucinações com o marido falecido, Denis Thatcher (Harry Lloyd quando jovem e Jim Broadbent quando mais velho), Margaret Thatcher vai relembrando os momentos mais importantes de sua vida (a entrada na política, depois de se formar na Universidade de Oxford; a decisão por concorrer à líder do Partido Conservador; a eleição ao cargo de Primeira-Ministra; as diversas crises políticas, econômicas e trabalhistas enfrentadas por ela e a crise final que levou ao seu pedido de renúncia do cargo para o qual foi eleita, na época das negociações que levaram à criação da União Européia). O roteiro não se aprofunda em nenhuma dessas questões, mas enfatiza bastante a forma enérgica com que Thatcher encarou todos esses obstáculos, adotando uma postura firme e forte para ter as suas opiniões levadas a sério e poder, consequentemente, desbravar, como mulher, um campo altamente dominado pelos homens.

Por isso mesmo, chama a atenção o fato de Phyllida Lloyd ter trabalhado com uma edição um tanto histriônica, especialmente nas cenas que retratam o ápice da popularidade e do ódio a tudo aquilo que Thatcher representava. Se o objetivo era dar um ritmo mais ágil ao filme, o tiro saiu pela culatra já que esses cortes rápidos enfraquecem e não combinam com a visão que temos da austeridade da Margaret Thatcher do exercício de poder e da senhora idosa assustada do tempo presente, uma mulher praticamente assombrada pelo que um dia foi. O que queremos dizer com isso é que Lloyd deveria ter emulado o estilo da sua personagem principal e ter exercido um pulso mais firme na cadeira de diretor. “A Dama de Ferro” pedia essa sobriedade, que é tão típica dos ingleses.

Ainda bem, então, que Phyllida Lloyd contou com a figura de Meryl Streep que, aqui, como esperado, entrega uma sensacional performance. O maior acerto da diretora foi ter deixado-a livre para fazer aquilo que ela sabe desempenhar melhor. Pelo trabalho neste filme, a atriz norte-americana recebeu sua 17ª indicação ao Oscar, um recorde absoluto na premiação. Fazia 29 anos que Meryl não ganhava o prêmio. Por “A Dama de Ferro”, que acabou lhe rendendo seu tão esperado terceiro Oscar, ela tinha um papel com todos aqueles elementos que a AMPAS adora: transformação física (por meio da maquiagem), sotaque, personalidade da vida real, um filme autobiográfico. Se não ganhasse dessa vez, sinceramente, não saberia o que Meryl teria que fazer para conquistar os votantes da Academia.

Cotação: 7,5

A Dama de Ferro (The Iron Lady, 2011)
Direção: Phyllida Lloyd
Roteiro: Abi Morgan
Elenco: Meryl Streep, Jim Broadbent, Iain Glen, Alexandra Roach, Olivia Colman, Harry Lloyd, Anthony Head



Jornalista e Publicitária


Comentários


Então Ka, não concordo com vc aqui. Acho que tanto O discurso do rei quanto a A dama de ferro são muito reverentes a seus biografados. Lembra-se que houve omissões da simpatia da coroa britânica pelo nazismo no vencedor do Oscar do ano passado? Em A dama de ferro, o filme só no final oferece um contraponto quase protocolar à figura de Thatcher. ambos os filmes são extremamente inferiores à A rainha. Não só em matéria de cinema, como também em acuidade histórica. Enfim, de qualquer maneira salva-se por Meryl Streep – ainda que ela não merecesse o Oscar por esse filme.
Bjs

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Reinaldo, eu não senti a reverência com o biografado em “A Dama de Ferro”. Concordo em relação a “O Discurso do Rei”. Sim, me lembro dessas omissões. O retrato de “A Dama de Ferro” pode ser até um tanto burocrático em relação à figura de Thatcher, mas acho que o lado bom e o ruim dela está ali, especialmente do governo dela. E concordo, finalmente, contigo, em relação à comparação feita com “A Rainha”. Tanto “A Dama de Ferro” quanto “O Discurso do Rei” são dois filmes inferiores ao longa de Stephen Frears, que era o meu favorito no ano em que foi indicado ao Oscar. Beijos!

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Talvez seja o texto mais positivo que li sobre “A Dama de Ferro” que para mim vale por sua protagonista, Meryl monstro Streep. Oscar merecido, por carregar o filme nas costas, graças a essa liberdade que a diretora deu a atriz, como você bem disse. No mais, um filme esquecível.

Beijos!

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Alyson, não sei se meu texto é o mais positivo, porque eu aponto os elementos positivos e negativos que o filme teve, na minha opinião. Acho que o filme acaba valendo mesmo pela Meryl, que carrega o filme nas costas. E, infelizmente, concordo também que este é um longa bastante esquecível. Beijos!

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Kamila eu não vi o filme.Concordo que a academia adora um filme autobiografico.Esse papel que rendeu o 3° Oscar a Meryl Streep tem o perfil(não compara atores) de Ben Kingsley/Ghandi,Jamie Foxx/Ray(eu sei que vc DETESTA,mas é uma atuação que a academia ama),Marion Cotillard/Piaf…e por aí vai.Não confio em Phyllida Lyod,já em Meryl Streep eu aposto todas as minhas fichas.

Beijos!

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eu tenho um fraco por filmes ingleses – “infelizmente” amei o filme, por mais que a direção se perca em muitos momentos. acho que o maior problema é a foma apaixonada pela retrada. de qualquer forma meryl streep mata a pau com sua atuação soberba, digna daquele oscar que comemorei horrores.

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Paulo, sim, a AMPAS adora filmes neste estilo. A Phyllida Lloyd já deu provas de sua irregularidade como diretora. Acaba que Meryl Streep é o grande destaque mesmo desse filme. Beijos!

Cleber, eu também adoro filmes ingleses e acho que até apreciei “A Dama de Ferro” mais que a maioria, apesar de reconhecer os pontos fracos do longa. E eu juro que não consigo ver essa paixão toda no retrato de vida da Margaret Thatcher. Acho que foi uma visão respeitosa dela, mas mostrando também o lado mais controverso da personalidade dela.

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Meryl Streep é alma do filme, uma monstra em cena. E não achei o filme em si ruim, mas tive alguns probleminhas com a edição. Deve ser culpa da direção burocrática.

Beijos! 😉

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Como sempre estou cheia de vontade de assistir e com pouco tempo. Eu sou fã número um de Meryl então sei que pelo menos de sua atuação vou gostar. Uma amiga minha assistiu e achou um pouco didático demais.

Será?

beijinhos

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Mayara, concordo com você em tudo, exceto no fato de você achar a direção da Phyllida Lloyd seja burocrática. Eu considero o trabalho dela aqui totalmente exagerado. Beijos!

Flá, eu também adoro a Meryl. Acho-a sensacional como atriz e, nesse filme, ela corresponde a todas as expectativas, como sempre, com um trabalho notável de atuação. E eu não diria que é um filme didático demais. É uma cinebiografia tradicional, com uma linha narrativa até clichê. Beijos!

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Um dos poucos textos que não destroem o filme. Muito boa a sua abordagem e Meryl Streep realmente alavanca a história fazendo com que, às vezes, nos esqueçamos de que o filme tem alguns defeitinhos bem salientes.

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Não me interesso pela história do filme, vou esperar pra ver depois.

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Equipe UOPM, para que destruir um filme que, em sua essência, não é tão ruim quanto vários outros que a gente assiste? Pois é, a Meryl que, de uma certa forma, “salva” esse filme.

João Linno, eu não sou a maior fã do que a Margaret Thatcher representava na época dela, mas respeito a história dela e acho importante que o cinema relate histórias desse tipo.

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Kamila, o que mais me chamou atenção no filme, além do ótimo trabalho de Meryl , é como uma mulher que é tão fria quando pede para fazer afundar um alvo , no segundo momento se mostra dócil e sensibilizada pelas famílias dos tripulantes daquele determinado alvo. Não sei se vejo isso como erro do roteito, que se preocupa por demais em tornar aquela figura humana, ou se Thatcher de fato tinha comportamentos ambíguos.

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Flávio, não vejo isso que você citou como uma falha de roteiro. Vejo como uma forma de humanizar a figura de Margaret Thatcher, já que ela era conhecida pelo senso de austeridade, pela seriedade de seu caráter e pela dureza de suas posições e ações.

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Para mim, o filme vale por deixar Meryl Streep voar e dar o show que de fato dá. hehe. Achei a escolha da velhice clichê mesmo, e até tola. O filme poderia ser muito mais, uma pena.

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Todo mundo sabia que Phyllida Lloyd não era a diretora certa para esse filme – ela simplesmente não tinha embasamento ou cacife para tomar as rédeas do projeto. E Phyllida não desapontou! Se “A Dama de Ferro” tivesse um diretor experiente atrás das câmeras, certamente não seria tão decepcionante. Fiquei um pouco triste que o impecável desempenho de Meryl esteja em um filme tão falho. Imaginava que ela venceria seu tão esperado terceiro Oscar por um filme, no mínimo, consistente e interessante. Mas nem podemos reclamar, né! Não sei se era a intenção da Phyllida, mas foi ela que proporcionou à Meryl o papel PERFEITO para vencer o prêmio!

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Amanda, exatamente. Concordo em tudo!

Matheus, pois é, a Phyllida acabou fazendo aquilo que se esperava dela. E era o papel PERFEITO mesmo pra dar o terceiro Oscar pra Meryl. A isso seremos eternamente gratos à Phyllida.

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Acho todo o desenvolvimento desse filme um erro atrás do outro. Pra mim, a diretora não se sai bem nem quando retira o maior risco do filme: adentrar as questões políticas que marcaram o mandato da primeira-ministra. É como se ela procurasse o caminho mais fácil sem sujar as mãos (até porque existem muitas pedras no caminho político que Tatcher traçou em seu polêmico mandato), mesmo que seja perceptível no filme uma certa e perigosa complacência para com a personagem. Sobra então recortes sem aprofundamento algum dos principais momentos da vida de Tatcher, deixando sempre à mostra uma abordagem mais rasa dessas etapas. Sem falar que os diálogos são péssimos, muito bobos e clichês. E perdão, mas nem a composição incrível da Streep salva o filme do desastre. Vindo da mesma diretora de Mamma Mia, sinceramente, não esperava muita coisa.

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Rafael, realmente, ela não aprofunda as questões políticas vividas pela Margaret Thatcher como primeira-ministra. Ela aborda tudo de uma forma um tanto superficial. E eu continuo a dizer que não enxerguei essa complacência toda com a personagem. Eu acho que a Streep sai incólume do longa, tanto que ganhou o Oscar. E a gente, infelizmente, esperava mesmo esse resultado do filme. Não dava para ter outro resultado. É um filme da Phyllida Lloyd, poxa!!

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Antes de começar a comentar este filme é importante fazer a seguinte pergunta: Você gostou de “o brilho eterno de uma mente sem lembranças(2004)” e “a origem(2010)”? Então, provavelmente você irá gostar de “a dama de ferro”. Com certeza, alguns concordarão mais com o primeiro do que o segundo. Até porque, o primeiro é do gênero Drama, mais próximo de a dama de ferro e o segundo Ação. A equipe de produção realmente conseguiu transformar MS em MT. Para o ator/atriz olhar-se no espelho e ver o personagem que ele/ela representa, com certeza, o ajuda a entregar-se no papel que tem que assumir. Quando se trata de uma atriz no porte de MS, tudo fica mais fácil. No entanto, quando falamos do roteiro do filme em si, vemos somente um drama particular. Esse filme do mesmo jeito que conta trechos da história de MT poderia ser sobre a história de qualquer mulher que viveu os anos 50-60 e decidiu lutar contra o machismo mesmo que isso implicasse em “abandonar” filhos, casa e família.
O filme é muito vazio no conteúdo histórico. As passagens que citam a realidade são quase desnecessárias. Por isso, reafirmo que o filme trata mais da MT esposa/mãe do que MT chefe de Estado. Não duvido muito que futuramente algum diretor/roterista/produtor irá copiar ipsis literis esse filme e atribuir a nossa presidente Dilma. Afinal as histórias de maneira geral são parecidas.

P.S: Kamila, não notei erros de edição. Entendi que se tratava da narrativa feita de “dentro” da cabeça de uma senhora caduca. O que foi muito bem feito.

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Marques, gosto bem mais de “A Origem” do que de “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças”. Sim, com certeza, um bom trabalho de caracterização física (maquiagem, cabelo, figurino) ajuda o ator a entrar melhor na pele da personagem que irá interpretar e a se sentir, de fato, aquela pessoa e, nesse sentido, o trabalho nessa área, em “A Dama de Ferro” foi sensacional. Só me permita discordar de você em relação às analogias que você fez em relação a esse filme e aqueles outros dois. Acho que a comparação não cabe, porque “ A Origem” e “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças” são filmes bem mais densos, mais bem realizados que esse aqui.

Concordo com sua observação em relação ao roteiro, com a diferença que não estamos falando de qualquer mulher que teve que se firmar num mundo dominado por homens. Estamos falando de Margaret Thatcher e a história dela, por si só, já é merecida de um relato. Eu também assisti a este filme pensando que, se um dia vierem a fazer uma cinebiografia sobre Dilma Rousseff, esse é o caminho a ser seguido.

Quando falo de erros de edição me refiro ao que eu chamei de edição histriônica, cheia de cortes, emulando o estilo videoclipe, quase que numa linguagem pop, que não combina com a sobriedade desta personagem em particular.

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Aprendi uma palavra nova. Não conhecia esse adjetivo. Entendi os cortes como lapsos de memória, por isso bem picotado. Bem mastigado! As idas e vindas prendem muito nossa atenção no filme. Recordo que só olhei para o contador do DVD quando já tinham passado 48 minutos, mas pareciam 15 minutos de filme.
Não vou acessar mais seu blog…Cibele está censurando meus comentários. Abaixo a CENSURA!!!!

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Marques, eu entendo o teu raciocínio em relação à edição picotada, mas eu não vejo dessa forma. Sim, as idas e vindas prendem demais a atenção. A história flui bem. Diz a Cibele que você pode acessar e comentar à vontade. Gosto do debate! Você levanta pontos interessantes! rsrsrsrs

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