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O Vôo

publicado em:15/02/13 1:31 AM por: Kamila Azevedo Cinema

Depois de nove anos se dedicando a filmes que exploravam a tecnologia de captura de performance, como as animações “O Expresso Polar”, “A Lenda de Beowulf” e “Os Fantasmas de Scrooge”, o diretor Robert Zemeckis retorna para o cinema live action com o drama “ O Vôo”. Com duas indicações ao Oscar 2013, o filme é uma daquelas obras que não é o que parece ser. Em sua superfície, “O Vôo” enfoca o heroísmo do piloto Whip Whitaker (Denzel Washington), que, numa manobra arriscada, após o avião que ele pilotava apresentar problemas de funcionamento, salva a vida de mais de 100 passageiros. Porém, a realidade é que o filme tem como foco principal a investigação feita pelas autoridades competentes sobre o caso.

A investigação fica também em segundo plano a partir do instante em que essas mesmas autoridades começam a abafar o grande segredo que acabam descobrindo. O Comandante Whip Whitaker, por trás de uma postura segura e corajosa, esconde um vício pesado em drogas e álcool. Na ocasião do acidente, inclusive, ele estava exercendo as suas atividades profissionais sob a influência de substâncias ilícitas. Essa descoberta permite a “O Vôo” entrar naquele que acaba, finalmente, sendo o tema principal do filme: a abordagem sobre como sucumbir a um vício pode acabar, pouco a pouco, com a vida de uma pessoa e daquelas que a rodeiam, em consequência disso, por causa das muitas mentiras que isso acaba evocando para poder se sustentar.

Neste sentido, o elemento mais importante do filme dirigido por Robert Zemeckis acaba sendo a atuação de Denzel Washington. O ator norte-americano está praticamente em todas as cenas de “O Vôo” e retrata de uma forma um tanto verdadeira os momentos de oscilação de alguém cuja vida está em frangalhos, não só por causa do acidente no qual esteve envolvido (e que teve vítimas fatais), como também por causa da falta de estabilidade emocional e, mais ainda, da sua recusa em admitir que necessita de ajuda para poder enfrentar os seus fantasmas. É justamente nesses momentos em que sua personagem reluta diante dos vários caminhos que pode seguir que a atuação de Denzel Washington encontra seus melhores momentos e, sem dúvida alguma, justifica a merecida indicação ao Oscar 2013 de Melhor Ator obtida por um dos profissionais mais camaleônicos do cinema norte-americano.

Entretanto, por mais que acerte na construção da personagem principal, “O Vôo” é um filme que peca muito justamente na conclusão do roteiro escrito por John Gatins. No ato final, o longa, que adota um tom um tanto tenso por boa parte da fita, especialmente a decorrente do fato da incerteza de Whip Whitaker encarar a realidade das consequências de seus atos, acaba caindo num maniqueísmo sem sentido, que reduz a jornada do protagonista a momentos em que a sua redenção e a sua transformação fica muito forçada. “O Vôo” seria muito mais enfático, neste sentido, se tivesse terminado a sua trajetória momentos antes, quando podemos ver nos olhos e na fisionomia da personagem que ele, realmente, acordou para a vida.

Indicações ao Oscar 2013
Melhor Ator
– Denzel Washington
Melhor Roteiro Original – John Gatins



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Jornalista e Publicitária


Comentários


“acaba caindo num maniqueísmo sem sentido” – discordo apesar de concordar com essa frase. hehehe. Explico (e na explicação terão spoilers)…

Concordo que a nossos olhos pareça forçado e maniqueísta ao extremo o desenrolar do roteiro. Mas, vendo as entrelinhas de Voo chego a conclusão de que ele tem um cunho evangélico. E dentro da lógica religiosa, Deus tudo pode e as mudanças podem ser assim de uma hora para outra. E sim, eles são maniqueístas (mas, tem sentido, hehe). Veja bem, todo o filme tem o nome de Deus soltado em diversos momentos, seja de maneira séria ou jocosa. Tudo é vontade de Deus, ato de Deus, porque Deus quis. Há uma visão bem exagerada do sexo, drogas e bebidas, como se só de chegar perto disso, você se torna o próprio capeta. E há claro, o momento crucial. Para continuar mentindo ele teria que manchar a memória da moça, ele baixa a cabeça e diz: Deus me ajude. E é como se Deus o ajudasse, pois ele fala a verdade e apesar de preso, “recupera” sua vida. Está em paz, dando o seu testemunho e começando um relacionamento mais próximo com o filho. Isso é tudo o que os evangélicos pregam.

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Tendo a concordar mais com a linha de pensamento da Amanda, ainda que divirja dela tb em alguns aspectos. Acho que o filme apresenta um bom contraponto entre fé e cinismo. E muito nosso querer que os filmes sejam cínicos em tempos cínicos.E a nossa fé no ser humano? Ou mesmo em Deus? Como fica? Acho que “O voo” adensa bem essa quetsão com essa ruptura no tom do registro no final. Não saberia dizer se foi algo pensado, mas funciona muito bem – ainda que tire um pouco do impacto do filme.
Bjs

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Amanda, excelente sua forma de raciocínio e vou ter que concordar com ela. Acho que o filme tem esse viés evangélico forte e o momento em que ele acorda pra vida (numa referência ao meu texto) é justamente esse em que ele percebe que vai ter que continuar mentindo mais, dessa vez manchando a memória da moça com quem ele tinha um envolvimento mais pessoal. De todo jeito, achei aquele final (ATENÇÃO PARA O SPOILER!), com a conversa dele com o filho, do negócio da “pessoa mais fascinante que eu jamais conheci” muito, mas muito forçado, muito manipulador… Preferia que o filme tivesse terminado após o testemunho dele na prisão.

Reinaldo, eu também acho que a linha de pensamento da Amanda faz sentido, apesar de continuar achando o final muito maniqueísta e isso tira o impacto do filme. Eu acho que o grande contraponto da história é bem esse que você citou em seu comentário: o contraste entre o cinismo do Whip com a questão religiosa, porque é a culpa dele que o leva à redenção e a religião explora bem esse conceito de culpa diante dos seus fieis.

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Denzel é um monstro. Me fez repensar a atuação de Nicolas Cage em “Despedida em Las Vegas”, que é caras e bocas se o compararmos com o grande ator de “O Voo”.

Bjs!

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Concordo que o ponto forte é atuação de Denzel Washington e o final é realmente moralista.O filme devia terminar no tribunal quando o protagonista revela a dependência química(demorei a reconhecer a Oscarizada Melissa Leo).Mereceu as duas nomeações ao Oscar.Bjs!

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Otavio, o Denzel é um ator de muita credibilidade. Disso, eu não tenho dúvida. Mas, acho estranho comparar as atuações dele e do Nicolas Cage. São dois filmes com propósitos muito diferentes.

Paulo, para mim, o filme deveria ter terminado na cena seguinte à do tribunal, com o testemunho do personagem do Denzel… Acho que a indicação à roteiro, pelo final moralista, deveria não ter existido…

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Pouca coisa me impressionou nesse filme. A melhor surpresa foi, sem dúvida, a cena do acidente. Que tensão! Quanto ao Denzel, ele já teve dias melhores e acho que é um tanto prejudicado pela previsibilidade do filme – que, para mim, em nada se diferencia de tantas outras histórias sobre alcoolistas em recuperação. Beijos!

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Matheus, a atuação do Denzel é a melhor coisa desse filme. O roteiro é que é o terror. Não entendo a indicação obtida pelo John Gatins ao Oscar. A cena do acidente, realmente, foi muito bem realizada e conduzida pelo Robert Zemeckis.

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Um ótimo estudo de personagem que ainda abre espaço para um entretenimento de qualidade. Este é “O Voo”, um retorno triunfal de Zemeckis na direção. A dobradinha dele com Denzel Washington é muito satisfatória.
Concordo muito com o seu texto.

Bjs!

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Elton, discordo que “O Vôo” seja um entretenimento de qualidade. Mas, de todo jeito, é um bom retorno do Zemeckis, um diretor que é muito bom e estava se dedicando a outros gêneros.

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