“Quando eu crescer, vou ser piloto de aviões velozes, vou fazer muitos filmes e vou ser um homem muito rico”. Esta frase foi dita por Howard Hughes quando ele ainda estava na sua infância. A profecia do menino revelou-se verdadeira e Hughes (Leonardo DiCaprio, na melhor atuação de sua carreira, indicado ao Oscar 2005 de Melhor Ator) tornou-se um magnata conhecido e uma figura excêntrica, cheia de manias. Mas, antes de ser excêntrico, Hughes era um grande empreendedor e suas idéias foram revolucionárias para a época em que ele viveu.

É este ambivalente personagem o tema da cinebiografia “O Aviador”, de Martin Scorsese (indicado ao Oscar de Melhor Diretor). O filme prefere abordar um determinado período da vida de Hughes – o que compreende os anos 20 até a década de 40 – e destaca a capacidade que Hughes teve em erguer seu império, ao mesmo tempo em que mostra o início do declínio da vida dele, quando ele se entregou à doença do Transtorno Obsessivo Compulsivo.

“O Aviador” começa com as filmagens de “Hells Angels”, filme dirigido por Hughes. O magnata aqui exibe seu perfeccionismo ao filmar e refilmar seqüências (ao todo, o filme demorou quatro anos para ser produzido), ao não hesitar em gastar sua fortuna (ele era o herdeiro de uma empresa de ferramentas) e resistindo às provocações da mídia (ele sempre iria sofrer com isso). Ver Hughes no set de filmagens nos dá um bom indício de quem ele era: um homem ousado para a sua época e inseguro de suas convicções.

O mesmo perfeccionismo e desprendimento que Hughes dedicava à sua carreira cinematográfica foram dados na mesma proporção àquela que era a sua grande paixão: a aviação. Hughes – através de sua empresa – se cercou dos melhores profissionais do ramo e desenvolveu os aviões mais potentes e modernos vistos naquela época. Sua paixão pelos aviões era tanta que ele comprou a sua própria companhia aérea – a TWA – e pilotava as suas próprias criações (chegando a ponto de sofrer acidentes, um deles retratado detalhadamente por Scorsese).

“O Aviador” também destaca os amores da vida de Hughes. O magnata desfilou com algumas das mulheres mais belas daquela época, como Jean Harlow (a cantora Gwen Stefani, fazendo a sua estréia como atriz de cinema); a lendária Katharine Hepburn (Cate Blanchett, numa atuação que começa exagerada e termina no tom certo e que acabou vencendo o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante), com quem Hughes viveu um romance atribulado e que quase terminou em casamento; e Ava Gardner (Kate Beckinsale), num relacionamento que parece ter sido mais uma grande amizade do que um amor marcante.

O filme mostra – com o mesmo destaque – os desafetos de Hughes. E eles foram muitos: Louis B. Mayer, o todo-poderoso dono da Metro Goldwyn Mayer (o maior estúdio cinematográfico da época); Juan Trippe (Alec Baldwin), o dono da Pan Am (companhia aérea concorrente da TWA) e o senador Ralph Owen Brewster (Alan Alda, indicado ao Oscar 2005 de Melhor Ator Coadjuvante) que, a mando de Trippe, inicia uma caça contra as bruxas (no caso, Hughes).

“O Aviador” é um filme grandioso, de cenários monumentais e cheio de estrelas (além dos atores já citados, John C. Reilly, Jude Law, Willem Dafoe, Frances Conroy e Danny Huston, entre outros, aparecem no filme). A película foi feita sob medida para agradar aos votantes das diversas premiações cinematográficas; e não é a toa que o filme foi o líder de indicações ao Oscar 2005, concorrendo a onze estatuetas, das quais venceu cinco.

Cada diretor tem uma marca, um estilo que o identifica e, conseqüentemente, o diferencia dos outros. Uma das marcas mais admiradas é a de Martin Scorsese. Entretanto, em “O Aviador”, a impressão que se tem é a de que não estamos assistindo a um filme deste aclamado diretor. Na época, isso pôde ser visto por um ponto de vista negativo, levando-se em consideração o fato de que Scorsese estava em plena busca – quase obsessão – para vencer um inédito Oscar de Melhor Diretor em sua carreira (que acabou vindo por “Os Infiltrados”).